terça-feira, 15 de maio de 2018

SAMBAQUIS: O que é isto?

Os sambaquis são acúmulos de conchas de moluscos e ossos de peixes, nos quais se encontram artefatos em pedra, osso e concha e sepultamentos humanos. Eles ocorrem na planície litorânea do Atlântico, junto de lagoas, canais, enseadas e rios desde o norte do Rio Grande do Sul até o Espírito Santo, mas também em outros estados brasileiros e na bacia amazônica.

O sambaqui, um fenômeno mundial, é vestígio de ocupação humana do período holocênico, a partir de quando a Humanidade passou a explorar intensamente recursos marinhos. Ele está ligado à subida das águas do Oceano depois do último grande período glacial, ao redor de 10.500 anos a. C., quando o mar estava mais de cem metros abaixo do nível atual. A maior parte dos sambaquis aparece como pequenos montículos, mas também existem os grandes morros, como o sambaqui do Carniça, no sul de Santa Catarina, cuja fotografia reproduzimos abaixo.

Até a década de 1960 se discutia no Brasil se os sambaquis eram depósitos naturais do mar ou produto de antigas populações humanas. Ambas as formações existem. Para os geólogos é interessante o primeiro tipo, para os arqueólogos o segundo. Até 1961 eles não tinham legislação protetora nacional e eram explorados para consolidar estradas, produzir cal para construção e ração para aves. A partir de então começou intensa pesquisa arqueológica.

Os sambaquis passaram a ser considerados testemunhos de assentamentos indígenas de populações que viviam na planície litorânea explorando os recursos da água e da Floresta Atlântica. Neles foram resgatados, para estudo, restos de alimentos, artefatos e esqueletos das sepulturas de seus membros falecidos. Entre os restos, que ilustramos abaixo há quebra-coquinhos ligados aos palmeirais da planície sedimentar, pesos de rede da pesca oceânica, pontas de osso para matar ou retalhar animais, ornamentos pessoais e pequenas esculturas em pedra, indicadores de uma população tecnicamente bem apetrechada.  

Os esqueletos dos mortos, enterrados estendidos ou dobrados sobre si mesmos, foram e continuam sendo objeto de inúmeras elaborações, buscando entender a alimentação da população, seu desenvolvimento e desempenho físicos, sua saúde, seu DNA para identificar o grupo biológico, sua origem e sua relação com outros grupos.

Durante os primeiros anos da pesquisa predominou entre os arqueólogos o pensamento de que se tratava dos vestígios de uma população pouco densa, dispersa ao longo do litoral e socialmente pouco estruturada. Alguns sambaquis teriam crescido até o tamanho que hoje conhecemos como resultado de sucessivas reocupações e não por acúmulo intencional de um grupo como símbolo de seu poder e domínio sobre a região. No século XXI a teoria do poder se afirmou. A razão dessas construções seriam, então, como na Europa e nos Estados Unidos, os numerosos mortos da população local, enterrados nesses montes. A partir deles, a população local, que se imagina numerosa, organizada, reivindicaria o domínio da região.

O modo de vida representado nos sambaquis da planície atlântica e da bacia do Amazonas foi estável e duradouro, estendendo-se de aproximadamente 8.000 a 1.000 anos atrás, quando grupos cultivadores de plantas tropicais se apossaram do território. Seus vestígios, mesmo protegidos por legislação federal, continuam sendo intensamente destruídos especialmente pelo avanço da urbanização sobre o litoral.

As três primeiras imagens são fotografias da década de 1950: na primeira, o sambaqui da Carniça, com 33 m de altura, ainda pouco impactado pelo homem; na segunda, a derrubada das conchas de uma alta parede para dentro de uma peneira mecânica, a qual deixava montes de material limpo, pronto para a queima; na terceira, já a fumaça dos fornos esconde o sambaqui. Do colossal monumento sobrou uma camada de um metro de altura.

As outras imagens mostram artefatos recolhidos na região.


O sambaqui da Carniça, antes da exploração
O início da exploração
Virando fumaça
Quebra-coquinhos
Tembetá e peso de rede
Zoólito: uma ave
Peça rara com impressões de corda
Pingente de concha e ponta de osso

Texto: Pedro Ignacio Schmitz
Fotos: Acervo IAP

quarta-feira, 2 de maio de 2018

PINTURAS RUPESTRES NOS CERRADOS DO BRASIL CENTRAL


Nos cerrados brasileiros as pinturas indígenas sobre rocha são muito abundantes e representam várias tradições e estilos. As tradições são organizadas pelos conteúdos veiculados: humanos, animais, objetos ou abstrações; os estilos pela maneira de sua apresentação: em movimento, parados, de frente, de perfil, formando composições ou isolados.

No cerrado brasileiro se conhecem várias tradições: Nordeste, de humanos em movimento, especialmente no Piaui e no Rio Grande do Norte; Planalto, de animais, principalmente veados em movimento, em Minas Gerais; Astronômica, representando fenômenos celestes como sol, lua, cometas, estrelas, na Bahía; São Francisco, abstrações multicores, em Minas Gerais e na Bahía; Geométrica, de abstrações simples em vermelho e preto, em Goiás.

Nesta postagem mostramos pinturas rupestres de Palestina de Goiás, antigo distrito de Caiapônia.

As pinturas são encontradas em dezenas de paredões e abrigos rasos sobre arenitos friáveis, que os expõem a muita erosão, que prejudica muito sua conservação.

 Nos anos de 1979, 1980 e 1981 a equipe de arqueologia do Programa Arqueológico de Goiás (convênio Universidade Católica de Goiás e Universidade do Vale do Rio dos Sinos) estudou uma área de concentração de pinturas, de que resultou o livro Caiapônia, de 334 páginas, publicado em 1986 pelo Instituto Anchietano de Pesquisas/UNISINOS. 

Pequenos fragmentos dessas pinturas, reproduzidos em tela, estão expostos em nossa sala de Memória Indígena. Partilhamos algumas fotos dessas telas.

A capa do livro

O estilo Caiapônia, com elementos da tradição Nordeste, mostra figuras pequenas, feitas com poucos traços, formando cenas de humanos dançando, caçando, lutando, em família; ou de animais correndo e caminhando em fila. Entre os abstratos se encontram cruzes e carimbos.  A cor predominante são matizes de vermelho, resultante de minério de ferro ou manganês, misturado com gordura ou resina.

As pinturas foram feitas por indígenas caçadores e coletores, que habitavam a região milhares de anos atrás e que usavam as paredes rochosas para registrar suas ideias vivências e ocorrência da vida cotidiana.

Brincando

Representações variadas
Representações variadas
Os dançarinos
A alimentação: peixe, tubérculos, mel, a caça ao veado com duas crias
Procissão de mascarados: séquito fúnebre
Caçando com lança-dardo (atlatl)

Texto: Ignácio Schmitz

Fotos: Acervo IAP.