quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

Ano da Ecologia e da Amazônia



A Virgem de Nazaré mostra seu filho e deseja muita paz e felicidade.
O Instituto Anchietano de Pesquisas se junta a ela.


A MÃE partilha seu FILHO com a mulher indígena e o religioso.
O povo indígena e moreno aplaude.


O presépio amazônico: a rede à sombra das palmeiras.
O povo canta em LIBRA e aplaude


Todos foram convocados: o monge carmelita, o intelectual jesuíta, as irmãzinhas da Imaculada e nós, que somos o POVO.
As imagens são do artesanato amazônico, em barro. Elas podem ser vistas na Sala de Memória Sacra, no átrio da Biblioteca da UNISINOS.

Texto: Profº. Drº. Pedro Ignácio Schmitz 
Imagens: Acervo Instituto Anchietano de Pesquisas




sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Pe. BARTOMEU MELIÁ, S.J. (07/12/1932 – 06/12/2019)


Faleceu na madrugada do dia 06 de dezembro de 2019, em Assunção, no Paraguai, aos 87 anos de idade, o Pe. Bartomeu Meliá, S.J.

Pe. Meliá era reconhecido internacionalmente por sua dedicação ao estudo dos Guarani e sua incansável luta pelos direitos dos povos originários.

Nascido em Porreres, Mallorca, Espanha em 7 de dezembro de 1932, em 1949 entra para a Companhia de Jesus. Cinco anos depois, em 1954, chega ao Paraguai como missionário, quando inicia estudos da língua Guarani e passa a se dedicar a esse grupo indígena, incluindo um longo tempo de convivência nas aldeias.

Da mesma forma que sua dedicação aos indígenas Guarani, Pe. Meliá também se destacou nos estudos missioneiros, com especial foco nas reduções jesuíticas da antiga Província do Paraguai.
Sua produção científica é imensa, através de livros, artigos, ensaios, entrevistas, participações em congressos entre muitas outras atividades acadêmicas, mas sem esquecer sua vida como jesuíta e religioso.

Sua história se confunde com a história da UNISINOS, a partir de sua atuação durante muitos anos no Programa de Pós-Graduação em História, tendo participado da fundação desse curso como membro de seu primeiro corpo docente.

Todos que o conheceram pessoalmente ou através de suas obras, sentirão muita falta de sua sempre lúcida contribuição.




quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

O QUE VOCÊ CONHECE DE RELÍQUIAS DE SANTOS? PARTE II


As outras relíquias são variadas e buscam fazer presentes, para veneração, meditação e possível imitação, aspectos da vida de Jesus, de Maria, de José e de outros cristãos.


No caso de Jesus elas buscam uma aproximação mais íntima, mística, apresentando elementos que lembram o presépio, as fraldas do recém-nascido Menino, a mesa do Cenáculo, a gruta da Agonia, a coluna da flagelação, o manto de púrpura, o lenho da cruz, o pano com que Jesus foi coberto na cruz, a pedra do Calvário, os panos com que Jesus foi envolvido no sepulcro, além de folhas de oliveira do Getsemani.

De Maria lembram-se as paredes da casa de Loreto, onde ela teria vivido, suas vestes, seu véu e seu sepulcro.

De São José lembra-se a casa de Loreto, onde teria trabalhado como chefe de família.

As relíquias de Jesus, de Maria e de José podiam servir para consolidar a memória de uma devota peregrinação à Terra Santa, servir para a meditação de um monge, ou tornar presentes os lugares e temas de um pesquisador bíblico como Gothardo  Boedler. Ele recebeu um relicário de 16 relíquias referentes à Terra Santa, cuja bula estampamos abaixo. O relicário correspondente não foi identificado no acervo. Há diversas outras bulas de relíquias semelhantes, mas ainda não encontramos estes objetos.

Figura 6. Uma bula.

A bula emitida por Fr. Antonio Ligi-Bussi Urbinas, Arcebispo de Icônio, Abade Comendatário de S. Lourenço Fora dos Muros, diz o seguinte em tradução livre do latim.

A todos em geral e aos particulares que virem este escrito afirmamos e atestamos que Nós, para a maior glória do Deus Onipotente e a veneração de seus santos, reconhecemos partículas sagradas de: Presépio, Cenáculo, gruta da Agonia e Pedra do Calvário de Nosso Senhor Jesus Cristo, das paredes da venerável casa de Loreto da B. V. Virgem Maria, de São José seu esposo, fios de cabelo da cabeça de São João Batista, ... do sepulcro dos pais de ..., das relíquias e ossos dos Santos Apóstolos e Evangelistas e de outros 43 santos, que, trazidas de lugares identificados, colocamos na teca  quadrangular de madeira, bem fechada por um vidro, ligada com um fio de seda vermelha e com nosso selo, as entregamos  a B.D. Gothardo Boedler,  com o direito de mantê-las consigo, dá-las a outros, leva-las para fora dos muros e expô-las para veneração pública de fiéis em qualquer igreja, oratório ou capela. Para este fim mandamos nosso secretário, abaixo firmado, expedir este escrito, que tem nossa assinatura e nosso carimbo.

Roma, de nossa sede, no dia 29 de julho de 1858.

Os termos da bula sugerem que Gothardo era religioso, mas não conseguimos indicar sua instituição.

Outros relicários recordam preferencialmente o nome do santo e sua importância na história do cristianismo. Começam com Santa Ana, avó de Jesus, continuam com Zacarias do Templo, São João Batista, os apóstolos, Maria Madalena, os Santos Padres antigos, os fundadores de ordens, congregações e mosteiros, os papas, os bispos proeminentes, os mártires (M), os confessores (C), as Virgens (V), os doutores (D), antigos e não tanto; uma lembrança das mais importantes personalidades do cristianismo. Entre estes, o cristão poderia escolher o santo ou os santos, com os quais gostaria de se identificar, especialmente o santo do nome recebido no batismo. Assim ele se percebia membro do corpo da Igreja, cujos santos lhe serviam de exemplo, de protetores e intercessores junto a Deus e podia sentir-se na Comunhão dos Santos.  O acervo, que os reúne, possibilita ver as opções individuais e as coletivas.

Organizamos a lista dos santos em ordem alfabética pelo nome.

Santa Ana,
Santo André Apóstolo,
S. Afonso de Ligori,
Santo Agostinho, bispo,
Santo AntonioTab.
Santo Adeodato M.,
Santo Aurélio M.,
Santa Barbara V.,
São Basilio bispo e D.,
São Bento abade,
Santa Benedita V.M.,
São Boaventura,
Beato Bernardo de Fos. C.,
São Carlos bispo e D.,
Santa Clara,
São Camilo de Lelis,
Beato Carlos S.,
São Carlos de Seia C.,
São Clemente M.,
São Domingos C.,
P. Ducoudray,
Beato Egidio de Assis C.,
São Francisco,
São Francisco de Sales,
São Francisco de Paula,
São Florêncio M.,
São Felipe Nery,
São Gercino,
Santa Gertrudes,
Santa Helena,
São João Batista,
Beato Irmão Jordan Mai,
São José Pros e Jac. Kiliani bispo e M.
São João,
São João de Alverne C.,
São Juvenal,
Beata Krescentia v. Kaufb.,
São Leonardo de P. Maur. C.,
São Leopoldo,
São Liberato M.,
 Santa Maria Magdalena,
Santa M. Tereza,
Mártires de Treveris,
São Nicolau Myra bispo C.,
São Pancrácio,
São Paulo,
São Pedro,
São Pio X,
São Pio M.,
São Próspero M.,
B. Rodolfo Jo.,
São Roque C.,
São Sebastião M.,
Santa Sibila V.M.,
São Simplicio M.,
São Tadeo,
Santa Tereza,
São Tiago Apóstolo,
Santo Tomaz de Aquino,
B. Thomaz de Flor. C.,
Santo Urbano Papa e M.,
Santa Ursula V. M.,
S. Verônica,
São Vicente de Paula,
São Vital M.,
São Xisto Papa e M.,
São Zacarias.

Se, depois de olhar o sentido e função das relíquias, examinamos criticamente seu material, algumas vezes teremos de dizer que o objeto apresentado dificilmente corresponderia ao que dele se afirma, especialmente no que se refere a Jesus, Maria e José. Mesmo assim elas cumpriam sua função de memória e eram uma ponte para chegar ao santo e, através deste, a Deus.

O conceito de relíquia facilmente nos remete à Idade Média. No acervo não identificamos nenhum exemplar dessa época. Das bulas conservadas, a mais antiga é de 1803; trinta (30) são do período entre 1850 e 1900; dezoito (18) são de 1901 a 1950; só uma é de 1959. Elas foram trazidas na bagagem dos jesuítas, que, nesse tempo vieram ao Brasil para atender os imigrantes de sua origem. Eram sacerdotes conservadores, firmes opositores do movimento liberal do norte da Europa, que, por isso, os expulsou. Para eles, que vieram como missionários para o Brasil, as relíquias tinham sentido e continuaram cumprindo sua função. Eles eram pobres, muito pobres, como também eram as pessoas atendidas e as obras que empreendiam. Por isso poucas relíquias apresentam algum brilho; a quase totalidade é simples e funcional.

Para finalizar queremos apresentar uma relíquia muito bonita e significativa de tudo o que acabamos de dizer. Ainda não encontramos sua bula, mas ela seria semelhante àquele que estampamos. Certamente pertenceu a uma pessoa religiosa de algum destaque em sua comunidade, como poderia ser o diretor de um seminário, um provincial ou um professor de teologia. O envoltório é uma teca de madeira em forma de cruz. Numa face está esculpido, em madeira, o corpo de Cristo; no alto a representação de Deus Pai e do Espírito Santo; aos pés, sua Mãe com o coração transpassado por uma espada. Distribuídas pelo corpo da cruz, que é fechado por um vidro transparente, estão 16 relíquias, representativos dos primeiros tempos da Igreja Católica: São Pedro, a Santa Cruz, André, Urbano, Quintino, Modesto, Marta, Madalena, Bárbara, Catarina, Leão Magno, Leonardo, Benedito, Inocêncio, Valentino, Magno. 

Figura 7 Relicário, face externa.


Figura 8. Relicário, face ventral.

As relíquias tornam presente, de forma mais concreta que as estátuas, os quadros, as medalhas e os ‘santinhos’, a memória do santo, do evento ou do local com o qual a pessoa desejava se relacionar. Enquanto objeto religioso serviam de pontos para meditação e, quando bem usadas, se tornavam pontes que ligavam para Deus.

Você gostou? Um catálogo das relíquias estará disponível, dentro de algum tempo, na página do Instituto.

Texto: Profº. Drº. Pedro Ignácio Schmitz
Fotos: Acervo Instituto Anchietano de Pesquisas

quarta-feira, 20 de novembro de 2019

O QUE VOCÊ CONHECE DE RELÍQUIAS DE SANTOS?



Hoje falamos sobre as relíquias de santos católicos, guardadas no acervo de Memória Sacra, que está aos cuidados do Instituto Anchietano de Pesquisas, junto ao átrio da biblioteca da Unisinos.

Elas vêm de residências, colégios e igrejas jesuítas do Sul do Brasil. A maior parte delas foi trazida pelos missionários jesuítas, que fundaram a província da Congregação no Sul do Brasil e representa devoções tradicionais existentes em sua terra de origem, na Europa. Em suas obras, no Sul do Brasil, eles mantiveram seu uso durante um século, desde quando chegaram, em meados do século XIX, até meados do século XX, quando já eram substituídos por uma geração de jesuítas nascidos no Brasil; também em consequência das reformas na Igreja Católica produzidas pelo Concílio Vaticano II.

Estas relíquias se constituem de elementos materiais supostamente ligados a santos e beatos da Igreja Católica. Eram e são usadas em memória e veneração dos correspondentes santos e tornam a estes mais presentes e palpáveis que as estátuas, os quadros, as medalhas e os ‘santinhos’, que também os podem visualizar. A base material que constitui a relíquia concreta é variada, podendo ser pequeno fragmento de osso ou de outra parte do corpo do santo, ou pequeno fragmento de objeto com o qual ele esteve em contato, ou que nele foi tocado.

Essas pequeníssimas partículas se apresentam fixadas em cápsulas de metal, ou de outro material resistente como pedra ou madeira, tendo uma face coberta por vidro para sua visualização e identificação do nome do santo. Para validade, na veneração do santo, cada uma delas vem acompanhada do documento (bula) de uma autoridade eclesiástica, ou religiosa, que a identifica e credencia. Das relíquias conservadas no acervo, uma parte ainda tem a bula correspondente, outra parte está sem ela, que se pode ter extraviado; há também bulas já sem a correspondente relíquia. Mais recentemente se substituiu a cápsula de metal por pequena folha de papel, com a identificação do santo e uma correspondente oração.

As relíquias podem ser fixas, como a pedra-de-ara, em mármore, encaixada na mesa do altar. Ela constitui o altar propriamente dito; contendo a relíquia de um santo romano, tem a função de ligar a igreja local à igreja-mãe de Roma. Antes do Concílio Vaticano II não havia igreja, pequena ou grande, sem a correspondente pedra-do-altar. No acervo da Memória Sacra havia diversas pedras-de-ara, recolhidas porque em desuso. Quatro foram devolvidas a igrejas locais, que, outra vez, se deram conta de seu significado e importância.

Figura 1. Pedras-de-ara.

A pedras-de-ara da foto medem, respectivamente, 40 x 30 x 2,3 cm e 30 x 20 x 2 cm.

A maior parte das relíquias é móvel, ou portátil. Neste caso, a estrutura que envolve a relíquia propriamente dita pode ser artisticamente elaborada e provida de uma base para mantê-la firme num altar ou sobre um móvel, para veneração pública ou particular. No acervo da Memória Sacra existem amostras, de tempos e estilos diferentes, gótico, barroco, clássico. 

Figura 2. Relíquias antigas (pequenas, centrais) com nova apresentação, gótica.


Figura 3. Relicários com armação barroca e clássica.

O envoltório da relíquia também pode ser uma cápsula de metal de poucos centímetros, simples e de fácil manuseio. Com isso, ela pode ser colocada sobre um móvel (p. ex. a mesa de trabalho do usuário), ou carregada no bolso ou numa bolsa, para devoção particular. Constitui a maior parte das relíquias guardadas no acervo da Memória Sacra. Sete dessas relíquias, geralmente duplicatas, foram doadas a igrejas da região que as solicitaram para suas capelas.

De preferência o relicário é de apenas um santo, porém muitas vezes um mesmo envoltório contém relíquias de vários e variados santos. Nas fotos, algumas amostras.



Figura 4. Relicários portáteis.

Quem são os santos lembrados e venerados nos relicários? Para esta postagem os dividimos em dois grupos: a) santos jesuítas, b) personagens importantes da Igreja Católica através do tempo, desde Jesus Cristo, de sua mãe Maria, dos apóstolos, de Maria Madalena, dos mártires e virgens da perseguição romana, dos Santos Padres dos primeiros séculos, dos fundadores de ordens e congregações religiosas, de mártires de tempos modernos etc. São pessoas que por sua vida ou atividade merecem ser lembrados e seguidos como exemplos de vida cristã.

Falamos primeiro dos jesuítas, naturalmente muito representados nas obras da Companhia de Jesus: Santo Inácio de Loyola, São Francisco Xavier, São Francisco de Borja, São Francisco Jerônimo, São Francisco de Regis, São Luiz Gonzaga, Santo Estanislao Kostka, São João Berchmans,  Santos Tiago Kisai, João Soan de Gotó, Paulo Miki, mártires japoneses, São José de Anchieta, Santo Afonso Rodrigues, São Pedro Canísio, São Pedro Claver, P. Paul Ginhac,  São Carlos Borromeu, Padres jesuítas mortos em Paris de 24 a 26 de maio de 1871, Santo André Bobola, São José Pignatelli, São Claudio de la Colombière, São Roberto Bellarmino, Beato Carlos Spinola, São Roque González.

Nas bulas correspondentes é indicada a origem e proveniência da relíquia.

São João Berchmans: do quarto, das cinzas, dos ossos, do sepulcro.

Santo Estanislao Kostka: dos ossos, do envoltório do cadáver.

São Luiz Gonzaga: do caixão, dos ossos, do lençol que envolveu o corpo.

Santo Inácio de Loiola: do caixão, das vestes, de partículas do tórax, da Santa Gruta de Manresa.

São Francisco Xavier: do sepulcro, dos ossos, do barrete.

São Pedro Claver: dos ossos, do barrete.

São Francisco de Borgia: dos ossos, da veste, do barrete.

São Pedro Canísio: dos ossos, da veste.

São João de Britto: do tronco em que foi pendurado.

Santo Afonso Rodrigues: da veste.

Santo André Bobola: do envoltório fúnebre. 

São João Francisco Regis: do caixão.

São Francisco de Jerônimo: dos ossos, da veste.

São Roque Gonzalez de Santa Cruz: do coração e plasma sanguíneo.

Santos mártires japoneses: dos ossos.

Suas relíquias são distribuídas principalmente aos membros da Congregação e aos participantes das obras. As bulas que as credenciam podem ser assinadas por um superior religioso.

Continua...

Texto: Prof. Dr. Pedro Ignácio Schmitz
Fotos: Acervo Instituto Anchietano de Pesquisas



segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Jandir Damo


Todos nós temos várias histórias. O ideal seria descobrir uma história de sucesso, uma história interessante para causar empatia com as pessoas. Então poderia ser importante falar sobre a vida pessoal, acadêmica e profissional. É o que tentarei fazer.

Quem sou eu? Nasci em Barão de Cotegipe, município situado na região do Alto Uruguai. Contudo meu registro de nascimento é de Erechim, já que à época do meu nascimento esse município era apenas um distrito. Sou o sexto filho de um total de oito, sendo que as duas meninas mais novas faleceram ainda na adolescência.

Sou filho de descendentes de italianos, pequenos agricultores. Meu pai nasceu em Bento Gonçalves, minha mãe em Marau. Ambos migraram, juntamente com a família, quando ainda crianças, para Barão de Cotegipe, durante a década de 1920, residindo, ao longo de suas existências, no mesmo local.


Minha família. Eu sou o terceiro na segunda fila a partir da direita.

Minha comunidade. A chegada de imigrantes de origem europeia à região, começou por volta de 1911, quando, aos poucos, foram vindo os colonizadores italianos, poloneses e ucranianos, surgindo, no Alto Uruguai, um povoado que se chamou, inicialmente, Floresta que, com o trabalho persistente dos colonizadores, teve sua emancipação decretada no dia 23 de janeiro de 1965, recebendo o nome de Barão de Cotegipe. Os migrantes eram atraídos não com intuito de fazer fortuna, mas, simplesmente, para terem um local onde pudessem criar seus filhos.

Desenvolviam uma espécie de agricultura de subsistência, uma modalidade, que tem como principal objetivo, a produção de alimentos para garantir a sobrevivência do agricultor, de sua família e de sua comunidade, sem nenhum recurso moderno. Os instrumentos agrícolas mais usados eram: foice, enxada e arado. Entre os principais produtos cultivados nas propriedades estavam arroz, feijão, milho, trigo, batatas, frutas e hortaliças.

Minha escolaridade básica. Ela ocorreu em três escolas diferentes: da primeira à quarta série, na Escola Municipal Visconde de Taunay, a quinta série no Colégio Cristo Rei, escola Particular pertencente às irmãs da Congregação filhas da Caridade de São Vicente de Paulo, e as demais séries no Colégio Estadual São José de Povoado Sérvia, todas, as escolas, pertencentes ao território do município de Barão de Cotegipe. Depois de concluído o ensino fundamental, fiz o ensino médio no Seminário Nossa Senhora da Salete em Marcelino Ramos, Rio Grande do Sul.

Meu ingresso no Seminário foi despertado pelo padre Ângelo Rosset, vigário da paróquia, que visitava a comunidade periodicamente. Esse religioso me confiou a missão de liderar o culto dominical, apesar de ter à época, pouca idade. Segundo ele, eu apresentava algumas habilidades para seguir a vida religiosa.

Minha vida acadêmica: 1. Graduação em Filosofia começou com o curso de Filosofia no então Colégio Máximo Cristo Rei, dos jesuítas, em São Leopoldo. O curso, na época, era dividido em duas etapas: Filosofia Eclesiástica, ministrada aos jesuítas no Colégio Cristo Rei e, Filosofia civil, ministrada no Campus da UNISINOS.

Com colegas no Colégio Cristo Rei.

Influenciado pela Filosofia Moderna, principalmente pelo pensamento de Descartes, pedi, a meus superiores, afastamento do Seminário. Para que pudesse seguir a caminhada necessitei buscar meu próprio sustento através do trabalho. Já dizia Benjamim Franklin: “O trabalho dignifica o homem”. Ou como diz um provérbio italiano: “El pan del sudor, el gá pí sapor”. O pão ganho com suor tem mais sabor.

Encontrei trabalho no Instituto Anchietano de Pesquisas, setor ligado à Universidade do Vale do Rio dos Sinos, cuja ênfase se dava na área da pesquisa arqueológica, história das Missões Jesuíticas, organização e preservação de acervos como sejam bibliotecas, museus de arqueologia e de memória sacra.

Na ocasião a sugestão do diretor do Instituto foi que eu pensasse, para meu trabalho de conclusão, algum tema ligado à minha etnia, indicando-me algumas obras interessantes sobre a Imigração Italiana no Rio Grande do Sul. Entre elas, a obra “Assim Vivem Os Italianos” escrita por Arlindo I. Battistel e Rovílio Costa, serviu-me de inspiração para escrever meu trabalho de Conclusão, cujo título é: Filosofia de Vida dos Italianos do Rio Grande do Sul. Na verdade, a elaboração da monografia obedeceu a um método de separação, distribuição e análise de provérbios. A intensão foi mostrar o modo de pensar do italiano no seu quotidiano, onde ele expressa seus valores materiais, humanos, morais e transcendentais.

Formatura em Filosofia

Minha vida acadêmica: 2.Graduação em História. Paralelo à pesquisa, para elaboração do trabalho de conclusão, trabalhei na organização de acervos. Um dos acervos interessantes e, do qual me orgulho de ter colaborado, é a Biblioteca da Província Sul Brasileira S.J. Foi durante a organização desse acervo que surgiu a ideia do curso de Licenciatura Plena em História, que foi concluído com a apresentação do Trabalho intitulado: Adversidades enfrentadas pelas reduções jesuíticas no século XVII, usando como fonte principal, as Cartas Ânuas.

Minha formação acadêmica: 3. Mestrado em História. Enquanto seguia o trabalho de organização da Biblioteca da Província, ia também, despertando o interesse de aprofundar os estudos na área das Missões, que levou ao ingresso no curso de Mestrado em História. É que, ao longo do tempo, ia descobrindo uma quantidade considerável de documentos e manuscritos dos jesuítas, estudiosos deste assunto. A convivência com muitos deles, como Pedro Ignácio Schmitz, Arnaldo Bruxel, Rafael Carbonel de Masy.  Arthur Rabuske, Bartomeu Melià, estimulou o interesse pela origem e desenvolvimento das missões jesuíticas na Bacia do Rio da Prata. A dissertação correspondente tem como Título: Guayra, no antigo Paraguay. Uma história de índios, colonos e missionários.

Todos esses cursos fizeram a base para meus trabalhos no Instituto Anchietano, para os quais faço pequenos comentários.

Principais atividades.
A organização da Biblioteca da Província é um acervo de uns cem mil exemplares, provenientes de casas jesuíticas desativadas ou de setores que se tornaram obsoletos. Compreendem desde obras muito antigas e raras, literatura em geral, textos escolares e muitos livros religiosos como missais, bíblias, rituais e breviários, além de coleções inteiras de periódicos, como o Deutsches Volklblatt. Esse acervo, depois de triado, higienizado e dividido em grandes setores muito serviu para pesquisas em diversas áreas, principalmente história. As centenas de Missais romanos, bíblias, breviários e outras obras ligadas ao culto religioso cristão fornecem rico material para o estudo da religião e da religiosidade entre os imigrantes de origem germânica. O Instituto tem, atualmente, dois projetos ligados a essas obras religiosas. Com a transferência recente do Instituto do centro da cidade para o Campus, este acervo foi consultado no sexto andar da Biblioteca da Unisinos.

Acompanhando a pesquisa sobre a Bíblia

Ainda sobram muitos exemplares da revista Pesquisas em duas salas no antigo assento do Instituto na cidade, que estão a meu cuidado, enquanto não é possível transferi-los para o novo espaço.

Manutenção da Biblioteca do Instituto e atendimento ao público. Com a transferência do Instituto também veio sua grande biblioteca, a qual reúne acervos pessoais de pesquisadores jesuítas ou leigos falecidos, mas principalmente o resultado do intercâmbio da Revista Pesquisas. Essa revista é dividida nas séries História, Antropologia, Botânica e Zoologia, que eram intercambiadas com instituições do mundo inteiro e traziam como permuta as correspondentes publicações. Ele reúne muitas obras clássicas, que eram difíceis de conseguir antes da Internet e uma quantidade de revistas internacionais. Com a transferência da cidade para o Campus foi necessário reorganizar o acervo e colocá-lo novamente à disposição. Um dos setores importantes é o que se refere às Reduções Jesuíticas do Paraguai e seu contexto. Ela também recolheu a biblioteca pessoal da Profa. Beatriz Vasconcelos Franzen e de Pedro Ignácio Schmitz. Meu trabalho principal é a biblioteca e suas disponibilização.

Registro de livros na sala de leitura da biblioteca

O acervo de Arqueologia. Com a transferência veio também o acervo de arqueologia, resultado de mais de cinquenta anos de pesquisas especialmente em duas regiões brasileiras: o Rio Grande do Sul e Santa Catarina no Subtrópico e, no Trópica, o Cerrado do Pantanal até o Sertão pernambucano. Durante todo o ano passado trabalhei em sua reorganização junto com o Pe. Schmitz. O trabalho ainda não está concluído.

Com um colega no acervo

Monitoramento de escolares no espaço Memória Sacra. Há um trabalho que me dá muita satisfação, é o monitoramento dos alunos das escolas no espaço da Memória Sacra, situado no saguão da biblioteca da Unisinos. Esse acervo reúne objetos religiosos provenientes de casas, paróquias e seminários de jesuítas que guardam a memória da atividade jesuítica. A maior parte é anterior ao Concílio Vaticano II e não estava sendo usada. São muitas centenas de alfaias (roupas usadas nos ritos religiosos ou por pessoas religiosas), cálices, ostensórios, relicários, missais, sacrários, estátuas, moveis variados e um altar de 1921. Mas também12 esculturas missioneiras restauradas, provenientes dos Sete Povos das Missões do Rio Grande do Sul, que são de especial interesse das escolas quando preparam sua visita à antiga redução de São Miguel. Contar a história dessas missões e dessas esculturas para as crianças é o que me dá maior satisfação. Este ano já passaram pelo espaço Memória Sacra mais de 2.300 crianças com visitas e também numerosos adultos curiosos ou interessados na história quando o espaço está aberto, duas vezes por semana.

Entre esculturas missioneiras


Assim era o antigo altar


Vestes e outros objetos sacros

Texto: Jandir Damo
Imagens: Acervo Pessoal de Jandir Damo - Acervo Instituto Anchietano de Pesquisas

 



quinta-feira, 17 de outubro de 2019

O HERBARIUM ANCHIETA E SUA IMPORTÃNCIA PARA A COMUNIDADE CIENTÍFICA E ESTUDOS DA BIODIVERSIDADE




O Herbarium Anchieta-PACA foi fundado pelo Pe. Balduíno Rambo em 1932. Estava sediado no Colégio Anchieta em Porto Alegre até o ano de 1964, quando foi transferido para o Instituto Anchietano de Pesquisas/UNISINOS, São Leopoldo.


Pe. Balduíno Rambo

Desde sua criação o herbário exerceu um papel fundamental junto à comunidade científica estadual, brasileira e também internacional, pois Pe. Rambo permutava informações, publicações e material com vários países de todo mundo. Quando da sua morte em 1961, Rambo já possuía na coleção 65.000 exemplares de plantas amostrando grande parte de diversidade do RS, também de outros estados brasileiros e muitas amostras estrangeiras.  

Desta coleção resultaram 40 trabalhos publicados, em vida, em diversas revistas científicas; e deixou prontos para publicação mais 14 manuscritos, num total de 930 páginas, referentes a outras famílias do seu herbário, os quais foram publicados após sua morte.

Com a morte de Rambo, o herbário passou a ser coordenado pelo Pe. Aloysio Sehnem dando continuidade à sua obra. Desta maneira, a coleção foi crescendo. O Pe. Sehnem dedicava-se especialmente a Briófitas, Pteridófitas e Orquidáceas, mas também cuidava de plantas em geral, que foram somando na coleção; disponibilizava-as para a realização de numerosos trabalhos em diferentes áreas da Botânica.

Pe. Aloysio Sehnem

Sehnem estudou praticamente todo o material do seu herbário particular, que juntamente com o de outros, resultou em cerca de 50 trabalhos científicos e a descrição de aproximadamente 100 táxons, incluindo espécies, variedades e formas novas para a Ciência.  Ele participou do Projeto Flora Ilustrada Catarinense, tendo estudado praticamente todas as famílias de Pteridófitas com exceção de Isoetaceae, Lycopodiaceae e Selaginelaceae,

Com a morte de Sehnem, em 1981, a curadoria do Herbário passou a ser exercida pelo Prof. Ronaldo Adelfo Wasum até o ano de 1993 e na sequência a bióloga Maria Salete Marchioretto assumiu esta função, a qual exerce até os dias de hoje. Ambos deram continuidade aos trabalhos iniciados pelos dois botânicos com a inclusão de novos exemplares através de projetos de pesquisa e seguiram a dinâmica de permutas, doações, empréstimos e publicação de numerosos trabalhos envolvendo a coleção. Embora os sucessores no cargo de curador do Herbarium Anchieta não sejam jesuítas, são biólogos que, imbuídos do mesmo espírito de Rambo e Sehnem, buscam dar continuidade à obra e coleção iniciada por eles com o maior zelo, rendendo graças por terem o privilégio de dispor desta preciosidade.

Atualmente o Herbarium Anchieta possui uma coleção de aproximadamente 142.000 exemplares. Está vinculado à Rede Brasileira de Herbários e à Rede de Herbários do RS. É considerado um dos maiores herbários do Estado e está muito bem representado no país. Conta com as coleções de Angiospermas, Licófitas e Samambaias, Briófitas, Fungos, Liquens, Algas e Madeiras. Além disso, possui uma rica coleção de Tipos Nomenclaturais somando cerca de 1.200 exemplares. Todas as imagens dos tipos estão disponíveis no site do Instituto Anchietano de Pesquisas e no Specieslink.



Tipos nomenclaturais de Angiospermas e Pteridófitas




Tipos nomenclaturais de Fungos e Briófitas

Sala da coleção de Angiospermas


Coleção de Fungos
Coleção de madeiras

O herbário possui seus dados informatizados e de fácil acesso a todos, estes podem ser encontrados através do Specieslink, no INCT Herbário Virtual da Flora e dos Fungos do Brasil, bem como pelo Sistema de Informação sobre a Biodiversidade Brasileira (SiBBr) e Global Biodiversity Information Facility (GBIF). Os acessos ao site Specieslink demonstraram que no ano de 2018 tiveram mais de 6.000.000 de visualizações. Estes dados serviram de base para numerosos trabalhos em nível nacional e internacional.

O herbário mantém intercâmbio com herbários nacionais e internacionais, através de empréstimos, permutas e doações integradas às pesquisas. Além disto, o herbário recebe frequentemente visitas de pesquisadores de diferentes instituições de ensino e pesquisa, que utilizam o acervo para desenvolver trabalhos técnicos, monografias de conclusão de curso, dissertações e teses de douorado. Neste sentido o herbário é um referencial nacional como coleção científica, tanto pelo seu acervo, quanto pela política de atendimento ás solicitações de empréstimos e informações.

Atualmente, existe maior preocupação com a conservação de ecossistemas, o que tem incentivado muitas atividades científicas no sentido de documentar nos herbários a flora de diferentes áreas remanescentes, que se encontram ameaçadas ou em processo de alteração. O Herbarium Anchieta está engajado no esforço em definir espécies ameaçadas de extinção da flora do Rio Grande do Sul, juntamente com projetos que visem a preservação e a conservação das mesmas.

Sala geral de trabalho e atendimento a alunos e pesquisadores

A dinâmica que envolve o herbário caracteriza-o como um autêntico laboratório prático e didático para o saber, envolvendo conhecimentos para a observação direta das amostras botânicas. Através da educação informal se estabelece um fluxo de atividades cotidianas no herbário, enquanto pela educação formal se dá a aprendizagem coordenada, articulada ao domínio do conhecimento científico, resultado dos constantes questionamentos da Ciência.
Com os processos educativos, é proporcionada análise, absorção e síntese das informações reconhecendo o papel fundamental do herbário como um instrumento básico de ensino, associado à formação de novos pesquisadores especializados em diferentes áreas da Botânica. O herbário tem uma atuação extremamente importante perante a comunidade científica, pois disponibiliza diretamente seu acervo aos pesquisadores e estudantes que trabalham com amostras vegetais, atendendo a uma grande demanda de consultas e empréstimos.

Imagens e Texto: Dra. Maria Salete Marchioretto
Curadora do Herbárium Anchieta, I.A.P., São Leopoldo.