Suliano Ferrasso, hoje pai de um lindo menino, Biólogo por formação, Arqueólogo por assim dizer ‘osmose’, descendente de italianos, nascido em Caxias do Sul, RS.
O início do processo de ‘osmose’ com a Arqueologia se iniciou em 2008, dois semestres antes se iniciava a formação em Biologia. Desde muito cedo o assunto de populações pré-históricas me atraía, em especial entender quais eram as bases que sustentavam estes povos, ou seja, qual era a sua alimentação.
Entre idas e vindas no início do curso de Biologia procurava absorver o que era possível, seja com leituras de livros e artigos, seja na busca por estágios em museus. Num primeiro momento pude me aproximar da paleontologia com um estágio no Museu da História Geológica da UNISINOS, juntamente com a prof. Dr. Tania Lindner Dutra, cuja experiência e sabedoria acerca da práxis científica foram muito enriquecedoras para mim.
Em 2007/2 cruzei com um curso intitulado ‘Zooarqueologia de Sítios Históricos’, o termo Zooarqueologia me causou uma inquietação. O que isto seria, o que estudaria, e principalmente qual era o profissional que trabalha esta área. Realizei o curso e lá conheci o zooarqueólogo, Dr. André Luis Jacobus, este biólogo por formação que há muito tempo se dedicava a estudar o tema, e com o qual durante o curso muito pude aprender e entender o que é definido por Zooarqueologia. Através dele descobri então o Instituto Anchietano de Pesquisas (IAP), também da UNISINOS. Com a recomendação do André Jacobus, fui ao IAP a procura de um estágio. Lá fui muito bem recebido pelo Me. André Osório Rosa, também biólogo por formação e que também se dedicava a pesquisa zooarqueológica num setor do IAP que possui estreita ligação com a arqueologia. No decorrer das idas ao IAP fui conhecendo e sendo bem recebido por toda a equipe. O Dr. Pedro Ignácio Schmitz, pessoa incrível e um grande pesquisador com o qual aprendo até hoje. O Dr. Marcus Vinícius Beber, historiador por formação. O Dr. Jairo Henrique Rogge, geólogo por formação. Dentro desta equipe interdisciplinar pude ir então vivenciando e aprendendo por ‘osmose’ sobre a Arqueologia. Desta forma se iniciou a minha vivência com ‘Eu e a Arqueologia’.
Comecei no IAP como Estagiário Voluntário em 2008, no decorrer do tempo fui Bolsista de Iniciação Científica, e depois em 2011 pude integrar o quadro funcional do IAP, onde trabalho desde então. Durante este tempo todo foram muitas horas de análise e interpretação no Laboratório de Zooarqueologia, entremeados a muitas saídas de campo com a equipe do IAP.
Em laboratório, o Zooarqueólogo necessita se abastecer de muito conhecimento, muita leitura sobre o assunto (teorias, métodos e perspectivas). De uma forma bastante abreviada o estudo zooarqueológico é anatomia comparada. Compara-se os vestígios alimentares pré-históricos com elementos conquiliológicos e ósseos de animais atuais, a partir desta informação básica se identifica nos vestígios as marcas de uso por populações pré-históricas e cruzando informações biológicas e culturais se começa o esboço dos padrões alimentares na pré-história. Esse conjunto de fatores (conhecimento prévio, identificação e interpretação) se desenvolve em laboratório, estudando diante de uma bibliografia, analisando um vestígio biológico e dando significado ao mesmo com a melhor interpretação possível.
A etapa que rende mais histórias e infinitamente muito aprendizado são as saídas de campo. Nestas ocasiões se aprende principalmente a distância entre a teoria e a prática. Nem sempre é fácil dividir uma Kombi entre oito pessoas, mais todos os equipamentos e bagagens numa viagem de seis horas num dia de sol de 36 graus. Começam aí os desafios e vemos como isso aproxima as pessoas.
Minhas vivências de campo me possibilitaram conhecer diferentes fisionomias sempre com a perspectiva da presença humana pretérita no meio ambiente. Isto é algo muito incomum dentro da formação em Biologia. Essa possibilidade de ampliar e visualizar estas dinâmicas sempre foi o que mais me atraiu, e sempre me motivou a continuar investindo nessa área. Pude participar de vários projetos, mas vou destacar três destes: Projeto Arroio do Sal (estudo de sítios litorâneos), Projeto São José do Cerrito (estudo de estruturas subterrâneas) e Projeto Uruguaiana (estudo de Estâncias Missioneiras).
No Projeto Arroio do Sal comecei a ter contato com o ecossistema marinho, sua riqueza em termos de fauna e flora, o seu complexo sistema de barreiras que caracteriza nosso litoral e o torna uma fisionomia única, isso tudo com a presença humana em tempos pretéritos atestado pela presença de Sambaquis e acampamentos de culturas ceramistas. Foram ótimas as saídas de campo, com a equipe muito discutimos sobre métodos de prospecção arqueológica e muito fui aprendendo sobre a Arqueologia. E também fui pensando sobre o que via nas aulas de biologia sobre questões ecológicas.
No Projeto São José do Cerrito pude experimentar a vivência num ambiente muito complexo e rico como a chamada Mata de Araucária, ou Floresta Ombrófila Mista, lá em meio a toda a riqueza biológica se encontram vestígios de populações pré-históricas do tronco Jê Meridional. Os vestígios destas populações são as popularmente chamadas ‘casas subterrâneas’, que através de seu estudo se pode verificar a estreita ligação deste povo com a Mata de Araucária e com tudo que ela oferece em recursos faunísticos e florísticos. Foram muitos anos de idas e vindas e muito estudo sobre estes povos. Nestas saídas de campo pude aprender muito sobre como escavar sob as aulas junto com o prof. Pedro Ignácio Schmitz.
No Projeto Uruguaiana foi uma outra experiência rica, em diversos sentidos, em termos de ambiente pude ter contato com um bioma extremamente rico e seriamente ameaçado, o famoso Pampa gaúcho. Pude ter contato e conhecer o verdadeiro gaúcho da fronteira, com seus costumes e seu jeito característico. A experiência se fosse por isso já seria ótima, mas foi muito além, e foi muito desafiadora, pois tive de novamente ir aprendendo por ‘osmose’ sobre um tema novo para mim até então, a Arqueologia Histórica. Novamente estar junto a uma equipe multidisciplinar foi fundamental, aprendi muito com os professores Marcus V. Beber e Jairo H. Rogge em campo, sobre o que olhar e como olhar, na medida do possível eu também ajudava a entendermos o ambiente no qual estávamos inseridos. Em laboratório tive muitas aulas com o prof. Pedro Ignácio Schmitz, a partir desse conjunto de aprendizados e saberes também pude ir contribuindo para agregar valor ao projeto.
Toda essa vivência dentro do ambiente da Arqueologia foi uma escolha minha e sempre me empenhei em dar meu melhor, com certeza ser determinado foi algo de definiu muitas coisas, mas igualmente a isto, ser bem recebido e ter pessoas dispostas a compartilhar e ensinar foi fundamental, sem os quais muito provavelmente não teria chegado até este ponto. Neste sentido costumo brincar, que é uma forma de descontrair, mas que é muito sério, aprendi Arqueologia por ‘osmose’ graças as oportunidades que tive, e que eu assumi com responsabilidade, e também por ter apoio de ótimos pesquisadores que muito me ensinaram.
Hoje sou Mestre em Biologia, em Diversidade e Manejo da Vida Silvestre, e continuo buscando trazer este conhecimento adquirido formalmente para dentro da Arqueologia, junto a uma importante equipe. Que é formada por pesquisadores, e também por funcionários que auxiliam nas tarefas administrativas dentro da instituição, este trabalho conjunto fazem os resultados renderem bons frutos.
Desta forma esboço aqui um pouquinho do meu ‘Eu e a Arqueologia’, com certeza daria para escrever muito mais histórias, mas este foi parte de um começo.
Projeto Arroio do Sal. Escavação de um Sambaqui. |
Projeto Arroio do Sal. Escavação de uma grande quadrícula em um Sambaqui. |
Projeto São José do Cerrito. Equipe do IAP chegando, em atividade de campo. |
Projeto Uruguaiana. Visão geral das taipas de pedra dos currais na Estância São Sebastião. |
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